quarta-feira, 28 de julho de 2010

Saudade

Às vezes é assim
Chega rápido e atordoa
Faz o tempo passar menos rápido
E traz de volta o de melhor
...daquele sonho.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Adélia Prado

Com licença poética

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.


Do livro Bagagem, primeira publicação da autora, de 1976.

sábado, 17 de julho de 2010

Estudar me emburrece

Títulos anunciam o quão respeitado um membro da sociedade acadêmica deve ser.
Títulos denunciam lutas contra o tempo na corrida por mais títulos.
E a falta deles reduz e menospreza o conhecimento tão comum do senso.

Estudar, realmente e cada vez mais, me emburrece!

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Passagem

As placas não indicam a melhor estrada
são sempre confusões e mentiras
As estradas não levam ao caminho desejado
são sempre frias e longas
Os pés levaram a lugares ilusórios
são sempre tumultuados e incertos
E o não saber pra onde ir
É sempre o melhor caminho!

quarta-feira, 14 de julho de 2010

"Eu antes tinha querido ser os outros para conhecer o que não era eu. Entendi então que eu já tinha sido os outros e isso era fácil. Minha experiência maior seria ser o outro dos outros: e o outro dos outros era eu."

Clarice Lispector

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Sim, caí

Caí, no canto
Escuro, fundo
No silêncio, agonia
Em busca de nós
Caí, no lado
Vão, receio
Com desconfiança, momento
Esperando ser tocado
Caí, no baixo
Preciso, dolorido
Atrás da porta, só
O que falha e se mantém
Caí, no tempo
Algema, mudo
Contesto, e me calo
Debaixo dos pés continua o medo.

domingo, 11 de julho de 2010

Glória

Sexo dos anjos mortais
Em pobres barcas que cintilam
Que assim foram rebaixados
No vai-e-vem de um rabicho
Dolorido e doce
Que atordoa sem pressa
E que requer a sua misericórdia.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Continuum

Às vezes o silêncio é a melhor resposta para algo que não há de ser respondido, mas no meu caso ele diz mais de uma moleca confusa que a mulher descontraída e (quase) segura.
O tempo é o maior aliado que tenho enquanto atravesso a tormenta, pois acredito que no não cessar da fúria só ele pode confortar os olhos que ardem e devolver a minha frieza. É triste ser assim: mesmo em companhia do maior dos cura-dores ser sozinha.
Estar sozinha num momento que o perder-se é cada vez mais presente e que a procura por ouvidos assusta, conduz à feridas mais dolorosas que o desespero da alma – ainda sozinha -, que os desencontros de vontades e realidades, que as carências...
O desejo de um ombro que acolha o desespero é enganar a si mesmo, uma mentira tão insuportável quanto a crença que uma fuga seria a solução. E quanta verdade é possível suportar?
O maior erro de um homem é confiar a sua verdade a outro homem.
Tentar compartilhar o desejo (mesmo o carnal) àquele que acreditas ser uma verdade é mais que utópico. E por mais que a liturgia ainda seja o impossível ela se desgasta e enferruja a tentativa de uma diversão nunca tentada.

O que eu faço agora? Sou uma viúva do tempo, fiz questão de me fazer assim. De tentar fazer que ele seja a segunda prioridade, e que a primeira seja sempre o que ele rouba de mim, a todo momento, o agora.

Ah! Quanto ao silêncio, acho que essa opção ainda não é somente o que me resta.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Demora, mas vem

Demora, mas vem
A vontade artificial
O sonho mal realizado
A cínica esperança
O vil do medo
As desculpas do desejo

Demora, mas vem
A culpa dissimulada
As olheiras disfarçadas
O abraço desencantado
O cansaço e a repulsa

Demora, mas vem
As pernas paralisadas
Os olhos amordaçados
E a escrita desacreditada

Demora, mas vem
A incerteza do tempo
O caos

Demorou, mas chegou
O desespero do fim.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Eu quero pra sempre

O teu riso incontrolável
Esse olhar desaforado
Essa conversa incomunicável
O cabelo despenteado

E o teu beijo...
que me arrebata!

Fuga

Hoje acordei mais tarde e não tomei aquele café amargo da manhã anterior.
Comecei o dia com desculpas esfarrapadas.
Almocei mentiras inúteis.
Vou jantar arrependimento e me deitar culpada.

Embora tarde demais e com pitadas de afronta, fica aqui mais uma tentativa de transformar em palavras o que não é possível.

domingo, 4 de julho de 2010

A palavra com alma!

Aquela que te envolve e permite um atordoamento pelo que não se deixa de sentir daquilo que se entende. São as melhores!

Conversas sobre teorias e teóricos de status não são mais que tempo atirado a imundice dos ralos.
Sinto falta de tempos que classificação encouraçada em medo era menos presente e havia caçada dos porquês.
Romantismo exagerado e ilusório? Sim! Eu também concordo, mas viver sem ele seria dolorido demais e um pouco mais difícil seria a busca pelas almas.

Procurar almas é difícil! Tenho procurado muitas almas... Tenho achado poucas almas, e, nas que encontro vejo que a minha faz-se cada vez mais seca. Buscar alimento para ela pode ser mais difícil que qualquer suposição aleatória mais elaborada que eu fizesse - e esta seria suficientemente fraca para alcançar a fonte para sustento.

Estou com fome! E ficar longe delas (almas) me faz menos, menos, menos e menos perto do que tenho procurado por esses caminhos de conversa que me atravessam...